sábado, 29 de abril de 2017

Casa da Antiga Fábrica de Cerâmica de Montargila, património classificado ou nem por isso?



Classificada como património de interesse municipal no Plano de Salvaguarda do Património Construído e Ambiental do Concelho de Oeiras,  Edital nº 361/2012, situa-se na estrada que vai de Algés para Linda a Velha (Rua João Chagas) e encontra-se hoje ao abandono. É caso para perguntar se, ser classificado como património de relevo para a história das localidades altera em algo o modo como se trata da sua preservação e conservação no concelho de Oeiras.
 Apesar de edilidade oeirense ter as ferramentas necessárias para obrigar o proprietário a efectuar obras de restauro, poder efectua-las compulsivamente caso não sejam cumpridas as obrigações inerentes à posse de um imóvel deste tipo, a verdade é que quem se encarrega destas questões nos meandros camarários demonstra uma passividade e um incompetência acima de qualquer normalidade. No entretanto, os anos vão passando e dia após dia maravilhas da memória da região como esta vão caminhando a passos largos para a total ruína e eventual desaparecimento.
 Mais estranho nesta situação é a isenção parcial de pagamento de IMI de 30% que todos os imóveis classificados no edital camarário de Plano de Salvaguarda do Património Construído e Ambiental, por via de serem objecto de obrigações específicas de conservação e restauro, havendo até imóveis que estão isentos em maiores percentagens como é o caso do Convento de São José de Ribamar em Algés, ora estas obrigações não estão a ser cumpridas como é claro e em Oeiras olha-se para o lado e assobia-se. Não se compreende que continuando ano após ano o não cumprimento das suas obrigações, estes fundos imobiliários detentores destas propriedades continuarem a beneficiar de isenções de IMI ... deveriam talvez serem obrigados a pagar todos os anos anteriores em que não cumpriram com as suas obrigações...


 Gostaria de saber a opinião dos diversos concorrentes à União das freguesias e à municipalidade oeirense quanto a este particular, quer-me bem parecer que, é questão que muito poucos conhecem, esta triste realidade que, no caso da Casa da Antiga Fábrica de Cerâmica de Montargila se arrasta há coisa de 10 anos. Seria até suposto aquando da construção da urbanização que a rodeia ter sido negociado o seu restauro e conservação mas a realidade é que o imóvel ainda sofreu danos durante a construção da urbanização e restauros é o que se vê ...



















A Antiga Fábrica de Cerâmica de Montargila

 A Fábrica de Cerâmica de Montargila, foi fundada em 1897 por J. J. Almeida Junça, remodelada e ampliada em 1906, funcionou até aos anos 60. Fabricava telha, telhão, tijolo, e artigos de cerâmica. Esses artigos são hoje raros e muito poucos registos são conhecidos hoje em dia, por incrível que pareça um deles encontra-se aqui bem perto no parque urbano da Quinta de Santo António, alguns tijolos com o carimbo da fábrica, provavelmente do início do século XX embelezam a calha de recolha da parte entre média do belo aqueduto que ali se encontra. Esse património único da industria da região encontra-se hoje semi destruído e a caminho de desaparecer, tal é o desprezo com que é tratado que, dois destes tijolos se encontram há coisa de um ano dentro do lago e é comum ver a criançada que por ali anda entretida em os arrancar sob o olhar desinteressado dos pais. Falta de informação? De civismo? O que é certo que é que estes "detalhes da história" são mais que importantes para a memória futura e deveriam estar devidamente assinalados e preservados.






 Facto interessante que resultou da minha pesquisa foi a possível participação no negócio da fábrica em parceria com J. J. Almeida Junça do artista José Estevão Cacella de Victoria Pereira, importante mestre do azulejo português. É mencionado na sua biografia que terá sido dono da fábrica mas sabemos também que a família Junça sempre tratou da gestão da fábrica, seria portanto uma sociedade constituída pela família Junça e pelo artista José Pereira, os proprietários da fábrica até à sua extinção, pouco depois da morte do artista.
 A  Fábrica de Cerâmica de Montargila, não foi instalada na antiga estrada que ligava Algés a Linda-a-Velha por acaso, a sua localização foi sabiamente escolhida devido à proximidade da matérias primas necessárias à sua produção, assim sendo para além da fábrica encarregada da transformação da argila em produto final, foi também autorizada uma industria extractiva de alguma importância.  Anexa à fábrica era feita a exploração de uma mina a céu aberto (Barreira) na encosta hoje chamada de monte dos marinheiros, sobranceira a Algés. Esta industria extractiva encarregava-se da produção de calcário, saibro e sobretudo de barro (desde sempre matéria prima de eleição da região). Fui encontrar detalhes da sua produção no Relatório de Estatística de Pedreiras de 1936, pág 1a, o qual nos diz estarem ali empregados 1 administrador e 24 trabalhadores e que teriam sido extraídos nesse ano 277,500 toneladas de calcário e 40,800 de saibro para venda, assim como 19473,600 de argila para consumo da fábrica.




 Que me perdoe o ilustre mestre Mário de Sampayo Ribeiro por contrariar as suas teorias sobre a toponímia do lugar de Algés mas, a existência desta pedreira e o particular de uma das suas produções serem o calcário deita por terra as suas conclusões publicadas nas paginas 33 da conferencia "Da Velha Algés" de 1938 na parte "Aditamento".




PEREIRA, José Estevão Cacella de Victoria (1877 - 1952)

Nasceu em Leiria, em 1877. Era filho do Major e escritor Albino Estevão de Victoria Pereira e de D. Carolina Amélia Cacella Lobo. Coronel, cartógrafo, fazendo parte da Comissão de História Militar, ganhou neste campo várias distinções internacionais. Esteve em Moçambique, participou na Guerra dos Boers, e na Primeira Guerra Mundial. Desde muito novo revelou dotes para o desenho e aguarela, e ao casar, em 1904, com Maria Adelaide de Sousa Pereira, filha do pintor Pereira Cão, tornou-se, de certa forma, um discípulo deste Mestre no campo da azulejaria. Como pintor ceramista teve a sua própria fábrica, a Fábrica Montargila, em Linda-a-Velha, e possuiu uma obra muito vasta da qual destacamos os seguintes edifícios: alguns dos silhares no Hospital de Santa Marta; no pátio dos canhões do Museu Militar; no r/c do Mercado da Ribeira (antigo 24 de Julho); no Hospital de São José; na Estação Sul e Sueste (perto do Terreiro do Paço); no Banco Nacional Ultramarino; num dos pavilhões da Exposição do Mundo Português; na Quinta da Regaleira (um painel de azulejos que dá para um dos portões de ferro da escadaria e fachada), em Sintra; no palácio da Exposição de Sevilha de 1929 (actual Consulado Português em Sevilha); na estação ferroviária de Óbidos e em muitas outras obras e casas particulares pelo país fora, incluindo os Açores. Era grande-oficial da Ordem de Avis e possuía as medalhas das Campanhas de África, da Vitória, e a de ouro da Classe de Comportamento Exemplar. Morreu em Lisboa, em 1952, na sua casa da Rua da Junqueira, nº 200.




Uma obra magnifica, o Picadeiro da Codelaria de Rio Frio




O Picadeiro coberto (15x30m) e as Cavalariças possuem um conjunto azulejar atribuído, na sua totalidade, ao pintor José Estevão Cancela de Vitória Pereira (1887-1952), em parceria com a fábrica de cerâmica Montargila (Algés, 1897- década de 60 do século XX).






No picadeiro, corredor e escadaria  manifesta-se uma forte influencia  dos temas decorativos  da azulejaria do século XVII, com cenas emolduradas por conchas, enrolamentos vegetalistas, volutas caras de anjo aladas, meninos atlantes, cartelas em remates de azulejos recortados.










1 comentário:

  1. Uma tristeza, uma vergonha mesmo, mas já estamos - infelizmente - habituados a que a CMO despreze o património histórico do concelho.

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